Díli, 15 jun (Lusa) - A ativistas
timorenses Bella Galhos disse hoje à Lusa que o seu nome foi retirado do elenco
ainda desconhecido do próximo Governo de Timor-Leste por questões
"morais" relacionadas com a sua orientação sexual.
"Esta é a informação interna
que me comunicaram, dentro do partido. O que me disseram é que por ser LGBT,
moralmente isso não é aceitável", afirmou.
Bella Galhos é militante do
Partido Libertação Popular (PLP), liderado pelo ex-Presidente da República Taur
Matan Ruak e que integra a Aliança de Mudança para o Progresso (AMP), a
coligação que venceu as eleições de 12 de maio com maioria absoluta.
Os dirigentes máximos da AMP -
Xanana Gusmão, presidente do Congresso Nacional da Reconstrução Timorense
(CNRT), Taur Matan Ruak e José Naimori (líder do Kmanek Haburas Unidade
Nacional Timor Oan (KHUNTO) - estão a fechar a composição do Governo.
"Não digo que esta posição
foi do 'irmão' Taur, mas fico desiludida que ele não tenha conseguido combater
esta posição", afirmou Galhos.
Galhos explicou à Lusa que, nas
conversas iniciais dentro do PLP foram referidas três áreas em que poderia vir
a trabalhar.
"Falou-se em Turismo, na Juventude
e Desporto e na Secretaria de Estado para a Política de Formação Profissional e
Emprego (SEPFOPE). Depois, numa segunda fase, falou-se em Igualdade de
Género", afirmou.
"Mas depois o meu nome foi
afastado por razões morais, por causa da minha orientação sexual", disse.
"Isto acontece porque eu sou
mulher, mas especialmente porque faço parte da comunidade LGBT", explicou,
admitindo que pode ter havido pressão, no seu caso, de religiosos em
Timor-Leste.
Galhos diz ficar "bastante
desiludida" com o facto de a questão moral ser levantada dentro do seu
próprio partido, afirmando que se sente traída por ter convencido jovens e
outros membros da comunidade LGBT a apoiar o PLP.
"É um grande desapontamento.
Eu nunca quis fazer parte de partidos políticos. O PLP atraiu-me porque era uma
alternativa e eu dei o meu contributo, incluindo financeiramente. Ajudei na
campanha e a apelar a jovens e jovens LGBT para nos apoiar", disse.
"A esses jovens dei-lhes
esperança de que com o PLP as coisas iam mudar, mas parece que afinal não é
assim. Sinto-me discriminada", afirmou.
Instado a comentar o caso,
Fidelis Magalhães, um dos principais dirigentes do PLP, disse desconhecer os
contornos da situação, insistindo que Bella Galhos é "uma pessoa valiosa
para o partido" com uma "obra e um contributo comunitário bem
reconhecidos".
Explicando não poder comentar o
caso ou a formação do Governo, cujas decisões "estão a ser tomadas pelos
líderes máximos dos partidos", Magalhães rejeitou que a questão da
orientação sexual possa ter sido um motivo.
"A Bella é uma pessoa
inteligente, pessoa respeitada e com um valioso contributo. Nos processos deste
tipo há muitos outros candidatos e eu nem sequer posso comentar o processo
porque não sei sequer se está ou não no Governo", disse.
Galhos, 46 anos, é uma das mais
conhecidas líderes da sociedade civil timorense, com um passado de violência
que começou dentro da família, às mãos do pai, que teve 18 mulheres e 45 filhos
e que aos três anos a vendeu por cinco dólares a um soldado indonésio.
O argumento, na altura, era de
que Galhos tinha uma "personalidade muito masculina, dominante". A
criança acabou por regressar a casa, depois de muito implorar da mãe.
Com 16 anos tornou-se elemento
ativo da resistência, foi agente duplo dentro das forças armadas indonésia -
onde esteve três anos marcados por muita violência física e sexual - e acabou
por conseguir, mais tarde, obter asilo político no Canadá.
Em 1999, depois do referendo em
que os timorenses escolheram a independência, voltou a Timor-Leste, trabalhou
nas Nações Unidas, completou um curso de psicologia e ocupou vários cargos em organizações
da sociedade civil.
Entre 2012 e 2017 foi conselheira
do então Presidente da República Taur Matan Ruak, período durante o qual
construiu e geriu a primeira 'Escola Verde' do país, em Leublora, a sul de Díli
onde funciona hoje uma quinta e restaurante de comida orgânica e uma
cooperativa de mulheres.
Atualmente gere a Pousada de
Maubisse, no centro do país.
ASP // FPA
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