sábado, 16 de junho de 2018

Ativista timorense diz que foi excluída do próximo Governo pela sua orientação sexual


Díli, 15 jun (Lusa) - A ativistas timorenses Bella Galhos disse hoje à Lusa que o seu nome foi retirado do elenco ainda desconhecido do próximo Governo de Timor-Leste por questões "morais" relacionadas com a sua orientação sexual.

"Esta é a informação interna que me comunicaram, dentro do partido. O que me disseram é que por ser LGBT, moralmente isso não é aceitável", afirmou.

Bella Galhos é militante do Partido Libertação Popular (PLP), liderado pelo ex-Presidente da República Taur Matan Ruak e que integra a Aliança de Mudança para o Progresso (AMP), a coligação que venceu as eleições de 12 de maio com maioria absoluta.

Os dirigentes máximos da AMP - Xanana Gusmão, presidente do Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT), Taur Matan Ruak e José Naimori (líder do Kmanek Haburas Unidade Nacional Timor Oan (KHUNTO) - estão a fechar a composição do Governo.

"Não digo que esta posição foi do 'irmão' Taur, mas fico desiludida que ele não tenha conseguido combater esta posição", afirmou Galhos.

Galhos explicou à Lusa que, nas conversas iniciais dentro do PLP foram referidas três áreas em que poderia vir a trabalhar.

"Falou-se em Turismo, na Juventude e Desporto e na Secretaria de Estado para a Política de Formação Profissional e Emprego (SEPFOPE). Depois, numa segunda fase, falou-se em Igualdade de Género", afirmou.

"Mas depois o meu nome foi afastado por razões morais, por causa da minha orientação sexual", disse.

"Isto acontece porque eu sou mulher, mas especialmente porque faço parte da comunidade LGBT", explicou, admitindo que pode ter havido pressão, no seu caso, de religiosos em Timor-Leste.

Galhos diz ficar "bastante desiludida" com o facto de a questão moral ser levantada dentro do seu próprio partido, afirmando que se sente traída por ter convencido jovens e outros membros da comunidade LGBT a apoiar o PLP.

"É um grande desapontamento. Eu nunca quis fazer parte de partidos políticos. O PLP atraiu-me porque era uma alternativa e eu dei o meu contributo, incluindo financeiramente. Ajudei na campanha e a apelar a jovens e jovens LGBT para nos apoiar", disse.

"A esses jovens dei-lhes esperança de que com o PLP as coisas iam mudar, mas parece que afinal não é assim. Sinto-me discriminada", afirmou.

Instado a comentar o caso, Fidelis Magalhães, um dos principais dirigentes do PLP, disse desconhecer os contornos da situação, insistindo que Bella Galhos é "uma pessoa valiosa para o partido" com uma "obra e um contributo comunitário bem reconhecidos".

Explicando não poder comentar o caso ou a formação do Governo, cujas decisões "estão a ser tomadas pelos líderes máximos dos partidos", Magalhães rejeitou que a questão da orientação sexual possa ter sido um motivo.

"A Bella é uma pessoa inteligente, pessoa respeitada e com um valioso contributo. Nos processos deste tipo há muitos outros candidatos e eu nem sequer posso comentar o processo porque não sei sequer se está ou não no Governo", disse.

Galhos, 46 anos, é uma das mais conhecidas líderes da sociedade civil timorense, com um passado de violência que começou dentro da família, às mãos do pai, que teve 18 mulheres e 45 filhos e que aos três anos a vendeu por cinco dólares a um soldado indonésio.

O argumento, na altura, era de que Galhos tinha uma "personalidade muito masculina, dominante". A criança acabou por regressar a casa, depois de muito implorar da mãe.

Com 16 anos tornou-se elemento ativo da resistência, foi agente duplo dentro das forças armadas indonésia - onde esteve três anos marcados por muita violência física e sexual - e acabou por conseguir, mais tarde, obter asilo político no Canadá.

Em 1999, depois do referendo em que os timorenses escolheram a independência, voltou a Timor-Leste, trabalhou nas Nações Unidas, completou um curso de psicologia e ocupou vários cargos em organizações da sociedade civil.

Entre 2012 e 2017 foi conselheira do então Presidente da República Taur Matan Ruak, período durante o qual construiu e geriu a primeira 'Escola Verde' do país, em Leublora, a sul de Díli onde funciona hoje uma quinta e restaurante de comida orgânica e uma cooperativa de mulheres.

Atualmente gere a Pousada de Maubisse, no centro do país.

ASP // FPA

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