Díli,
08 out (Lusa) - A irmã de Zeca Afonso, Maria das Dores, regressa este mês a
Timor-Leste, quase 70 anos depois de ter partido do território, onde chegou a
estar detida com os pais, durante três anos, num campo de concentração japonês.
A
história da vida de 'Mariazinha', dos seus irmãos, João e José (Zeca), e dos
pais é o fio condutor do documentário "Rosas de Ermera", uma
longa-metragem que está a ser realizada por Luís Filipe Rocha, numa produção da
Fado Filme.
No
material de promoção do documentário, Luis Filipe Rocha destaca que a sua
amizade com os Afonso dos Santos "permitiu conhecer com alguma
profundidade as aventuras e desventuras duma fascinante saga familiar".
"Tendo
como pano de fundo a História de Portugal e da Europa, de Timor e do Mundo,
entre 1939 e 1946, o tema principal do documentário será a revelação, no
verdadeiro sentido cinematográfico, das memórias de Maria das Dores, de João
Afonso dos Santos e do irmão já falecido, Zeca Afonso", explica.
"E,
através dessa revelação, dar a conhecer aspetos pouco iluminados de uma época
importante da nossa história 'pública e privada' do século passado",
sublinha.
Depois
de filmagens em Moçambique, onde a família se separou, Luís Felipe
Rocha chega sexta-feira a Díli para 10 dias de filmagens no país que
marcou a infância de Mariazinha.
"Acompanharemos
Maria das Dores na dilacerante separação dos irmãos e na viagem com os pais,
pelos Mares do Sul, em três barcos diferentes, até Timor. Procuraremos a Casa
em Lahane, a escola e a vida ao ar livre, no mato e nos ribeiros, com os amigos
Liquiçá, o cavalo que montava em pelo, e Bonita, a cabrinha preta",
descrevem os produtores.
A
história começa em 1939 quando os pais e Maria das Dores Afonso dos Santos,
então com sete anos, partem para Timor-Leste, onde o pai vai assumir o cargo de
juiz e os dois filhos do casal, João e José Afonso, de 11 e quase 10 anos,
seguem para Portugal.
Dois
meses depois dessa separação, a 01 de setembro de 1939, a Alemanha invade a
Polónia e, dois dias depois, a Grã-Bretanha, a França, a Austrália e a Nova
Zelândia declaram guerra à Alemanha, iniciando-se a 2ª Guerra Mundial.
O
Japão junta-se à guerra em dezembro de 1941 e a 20 de fevereiro do ano seguinte
invade e ocupa a ilha de Timor.
A
"vida serena" em que Maria das Dores "era a única e solitária
criança" vê-se transformada pela chegada da guerra e a "aterradora
noite da invasão japonesa", os barcos e os aviões, o quintal da casa
invadido, a rendição dum grupo de Holandeses, os Australianos refugiados na
selva.
Maria
das Dores, que recorda até hoje o cheiro a rosas em Ermera, o coração da região
do café timorense, a sudoeste de Díli e onde passou férias com os pais - só se
reencontra com os irmãos seis anos depois, em fevereiro de 1946.
Para
Portugal levou a vivência de Timor e a dor, medo e pavor sentidos durante os
quase três anos que passou num campo de concentração japonês.
Nos
irmãos encontra a asfixia do catolicismo do Estado Novo, a dor de um longo
período afastados dos pais e irmã e o temor da falta de noticias de Timor-Leste.
Esta
é a sinopse do documentário que ouve Maria das Dores e João Afonso, já ambos
com mais de 80 anos e que "continuam a recordar de
forma vivida e emocionada esse período das suas jovens vidas,
bem como a evocar comovidamente a companhia do irmão falecido em 1987".
Luís
Filipe Rocha entrelaça as recordações dos dois com as do seu irmão José num
diálogo, explicam os produtores, "a que a idade, a memória, a evocação
poética e os sentimentos duradouros conferem dramatismo e espessura
únicas".
"Rosas
de Ermera" é um título de grande simbolismo para a toda a família e já o
músico João Afonso, sobrinho de Zeca Afonso, se referia a elas na sua música
"O som dos sapatos".
ASP
// SO
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