Macau,
China, 07 mar (Lusa) -- O historiador José Pacheco Pereira considerou hoje que
é na língua e na literatura que a influência portuguesa "vai mais
longe" e não pode ser substituída pela "diplomacia económica",
lamentando os "desinvestimentos" dos últimos anos.
"Desinvestimos
no instituto Camões, desinvestiu-se nos leitorados das universidades.
Substitui-se isso por uma certa ideia de que a diplomacia económica resolvia o
problema da influência cultural. Não resolve, perdeu-se por um lado e perdeu-se
por outro. É evidente que a diplomacia económica é importante, mas depende
muito das conjunturas externas", afirmou, dando como exemplo a crise em
Angola, que é "gravíssima para Portugal".
Para
Pacheco Pereira, "Portugal, durante algum tempo, tentou (...) usar a
língua como instrumento de influência económica, social, cultural",
impulsionando a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e tentando
afirmar-se, por exemplo, como ponte entre a União Europeia e essas nações.
No
entanto, a crise e "um certo desprezo pelas questões culturais nos últimos
anos" levaram o país a "virar-se mais sobre si próprio" e a
aceitar "a perda de importância do português em muitos países onde a
língua portuguesa tinha cátedras" nas universidades ou onde era ensinado
como primeiro idioma ou como língua estrangeira, considerou.
A
"influência cultural é um fator muito relevante" para Portugal e a
presença da língua e da literatura portuguesa no mundo é "um património
que devia ser defendido de forma ativa", insistiu.
Pacheco
Pereira, que respondia a perguntas de jornalistas em Macau, considerou que a
presença portuguesa neste território, como em outras partes do mundo, é
"anacrónica num certo sentido", o que "não tem mal nenhum"
e "não é pejorativo".
"Está
presa a um momento histórico e sobrevive apenas pelo seu valor cultural e
histórico", afirmou, considerando que tem hoje "valor económico"
e "a utilidade da diferença" e de "dar mundo", do ponto de
vista de Macau, que é desde 1999 uma região administrativa especial da China.
Sobre
a China, considerou que "é uma experiência única", por ser "um
capitalismo com sucesso dirigido por um Partido Comunista".
No
entanto, a economia "necessariamente irá gerar tensões sobre o sistema
político" e "mais cedo ou mais tarde esta solução não é
sustentável".
Para
Pacheco Pereira, surgirão na China, a par do crescimento económico e do aumento
da população urbana, reivindicações de direitos laborais e políticos por parte
da classe média nascente.
"O
crescimento económico não pode continuar indefinidamente sem mudar o modelo da
sociedade", sublinhou, considerando que ou a China encontra mecanismos (a
nível sindical ou partidário, por exemplo) para canalizar a
"conflitualidade social" que vai surgir ou, a prazo, nascerá uma
"contradição entre o poder fechado e uma sociedade que à medida que cresce
e se desenvolve precisa de ser aberta".
Pacheco
Pereira participa por estes dias no Festival Literário de Macau e deu hoje uma
conferência na Universidade de Macau sobre a Europa.
A
este respeito, disse aos jornalistas que a crise europeia levou a uma
"degradação dos mecanismos democráticos" e a concentrar uma
"parte importante dos poderes nacionais na burocracia de Bruxelas" e
nos governos "que hoje mandam", como é o caso do Governo alemão.
Mas
a crise e a sua gestão levou também a "um tipo novo de contestação",
com os partidos "do poder" a perderem votos e a surgirem soluções de
governo como a portuguesa ou o atual impasse espanhol.
As
mudanças a este nível são "ainda muito iniciais", mas não devem ser
subestimadas, considerou.
"Começa
a haver mudança no espetro político e essa mudança não se sabe para onde vai,
mas que existem fatores de mudança, existem", afirmou.
Pacheco
Pereira considerou, por outro lado, "gravíssima" a crise dos
refugiados e sublinhou "a responsabilidade" da Europa na sua origem,
por ter "incentivado a guerra civil" em países como a Líbia ou a Síria
"e depois saiu-lhe o Daesh" [o Estado Islâmico].
MP
// VM
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