Díli, 06 jul (Lusa) - Um
ex-diplomata da ONU que fez parte da equipa de Timor-Leste espiada pela
Austrália em 2004, condenou hoje a decisão da justiça australiana em julgar
dois homens que revelaram esta operação de espionagem.
Em declarações ao jornal The
Guardian, Peter Galbraith considerou a acusação aos dois homens uma ação
"vingativa e sem sentido", quando o que a Austrália devia fazer era esquecer
este "episódio pouco edificante".
No final de junho, o Ministério
Público australiano decidiu acusar o antigo agente dos serviços de informação
australiano, conhecido apenas por 'testemunha K' e o seu advogado, Bernard
Collaery, de conspiração, num julgamento que deve começar a 25 de julho.
Os dois foram acusados de revelar
informação secreta, segundo um comunicado do Ministério Público. Caso sejam
considerados culpados em julgamento enfrentam uma pena máxima de dois anos de
prisão.
Peter Galbraith, diplomata
norte-americano ao serviço das Nações Unidas em Timor-Leste em 2004, fez parte
da equipa timorense que estava em negociações com a Austrália sobre o futuro do
Mar de Timor, altura em que Camberra usou a cobertura de um suposto programa
humanitário para colocar equipamento de espionagem nos espaços principais do
Palácio do Governo em Díli.
Galbraith insistiu que a operação
de espionagem conduzida contra ele e outros funcionários de Timor-Leste foi
"claramente um crime" à luz da lei internacional.
"É apenas vingativo e
inútil, é hora de seguir em frente. Finalmente, depois de 18 anos, a Austrália
fez a coisa certa [assinando o tratado de petróleo e gás em março desde ano].
Aceite os elogios, que são merecidos, e siga em frente", considerou.
A notícia da acusação está a
causar polémica na Austrália, tanto pelos fundamentos em si como pelo facto da
audiência poder vir a ser realizada à porta fechada.
Essa possibilidade foi já
criticada por vários altos quadros da justiça australiana, incluindo um ex-juiz
do Tribunal Supremo de Nova Gales do Sul, Anthony Whealy, que disse que tal
medida seria "perturbadora".
"A noção de que se pode ter
um julgamento secreto, sem um júri, e mandar alguém para a prisão dois anos - é
muito chocante", acrescentou Galbraith.
Em declarações à imprensa na
semana passada, o advogado Bernard Collaery afirmou que o seu cliente não era
um denunciador tendo utilizado os canais internos apropriados para levantar
preocupações sobre operação de espionagem.
De acordo com o advogado, a Testemunha
K apresentou uma reclamação ao inspetor geral de inteligência e segurança e
recebeu permissão para divulgar a operação.
O procurador-geral, Christian
Porter, disse na semana passada que a decisão de processar a 'Testemunha K' e
Collaery foi feita de forma independente pelo responsável do Ministério Público
da Commonwealth.
O caso, que só foi descoberto em
2013, causou um dos momentos de maior tensão diplomática entre Díli e Camberra,
especialmente porque a espionagem foi feita quando os dois países negociavam as
fronteiras marítimas.
A 'testemunha K' foi a chave da
denúncia apresentada por Timor-Leste contra a Austrália por espiar o Governo
timorense durante as negociações prévias de um acordo em 2004, com o objetivo
de favorecer a Austrália e o consórcio australiano liderado pela Woodside
Petroleum.
As acusações foram conhecidas
quando o legislador independente Andrew Wilkie, um ex-agente do serviço de
informações que se converteu em informante, revelou-as na sede do parlamento em
Camberra.
"Este Governo quer converter
um ex-agente da ASIS e o seu advogado em criminosos", referiu Wilkie
diante do Parlamento.
A 'testemunha K' deveria ter dado
o seu testemunho no Tribunal Permanente de Arbitragem, em Haia, no caso de
espionagem apresentado por Timor-Leste, mas não pode sair da Austrália porque o
seu passaporte foi confiscado em 2012.
Timor-Leste, por fim, retirou a
acusação como um ato de boa vontade antes de assinar um acordo em março passado
com a Austrália para delimitar a sua fronteira marítima e pôr fim à disputa que
os dois países mantiveram nos últimos anos pelo controlo de uma zona que inclui
a rica reserva de petróleo e gás Greater Sunrise.
ASP (CSR)//MIM
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