Díli, 10 jul (Lusa) - O líder da
coligação do Governo timorense, Xanana Gusmão, teceu hoje duras críticas à
decisão do Presidente não dar posse a vários membros do Governo, mostrando-se
preocupado com a "saúde mental, psicológica e política" do chefe de
Estado.
"Permita-me, Excelência, que
comece por o cumprimentar, desejando-lhe tudo de bom", escreve Xanana
Gusmão numa carta entregue hoje a Francisco Guterres Lu-Olo, a que a Lusa teve
acesso.
"Expresso-lhe este
sentimento, porque estou extremamente preocupado com a sua saúde mental,
psicológica e política, neste conturbado processo onde se impõe medirem-se as
competências, à luz de uma Constituição que os Senhores é que escreveram,
entendem com mestria e interpretam com uma sagacidade incomum, inacessível a
vulgares cidadãos como eu", escreve Xanana Gusmão.
Xanana Gusmão assina a carta como
presidente do CNRT e o documento foi enviado para o Presidente num momento de
tensão entre Lu-Olo, o primeiro-ministro Taur Matan Ruak e a Aliança de Mudança
para o Progresso (AMP), coligação que venceu as legislativas com maioria
absoluta e que integra o CNRT, o PLP (de Matan Ruak) e o KHUNTO.
Xanana Gusmão insiste que
"enquanto o Governo não se encontrar plenamente constituído, não é
possível, de forma politicamente responsável, apresentar o Programa de Governo
o que permitirá pôr fim ao sufoco financeiro que o país atravessa".
É preciso a nomeação dos membros
do Governo para "preparar, de forma séria e consistente, uma proposta de
Orçamento Geral do Estado para 2018 que retire o país do regime de duodécimos e
que assegure, de forma sistemática, regular e transparente, o financiamento das
despesas do Estado".
Se a situação se mantiver, diz,
"será da exclusiva responsabilidade do Presidente da República, que
insiste em manter a situação de impasse político criada por si próprio, por não
respeitar a vontade soberana do povo timorense".
"A situação política no
nosso país está em vias de um colapso e isto é grave, porque os recursos
financeiros do Estado são agora muito limitados, pelo que todos os Responsáveis
Políticos deveriam pautar as suas ações com prudência, honestidade e
sensatez.", escreve.
"Neste momento o país, o
nosso Povo, precisam que o Chefe de Estado demonstre estar à altura das altas
responsabilidades constitucionais que lhe incumbem, contribuindo para a
estabilidade política, para a governabilidade do Estado e para a paz
social", argumenta.
A carta deixa várias referências
a muitos dos temas que têm suscitado debate nos últimos anos em Timor-Leste,
desde o tema da corrupção à relação entre o próprio Xanana Gusmão e a Frente
Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) e até à acusação, por parte
da AMP, de que Lu-Olo atua mais como presidente da Fretilin do que do Estado.
Deixando várias declarações sobre
a leitura que o CNRT faz das competências do Presidente da República, Xanana
Gusmão tece acusações de posturas contraditórias de Lu-Olo face a assuntos que
incluem nomeações de cargos públicos.
No documento, Xanana Gusmão
ironiza com as referências que têm sido feitas ao seu partido e aos seus
membros, mas deixando sempre críticas duras ao chefe de Estado, com múltiplas
referências tanto ao passado da luta pela libertação de Timor-Leste da ocupação
indonésia como a casos já depois da restauração da independência.
"Estou, de corpo e alma,
arrasadíssimo porque tenho um partido corrupto, cheio de milícias e
autonomistas, sem veteranos de gema e fulgor como é vossa excelência e seus
camaradas, um partido político cujos quadros e demais membros não entendem nem
falam o português e são presumivelmente detestados pela maioria do povo, povo
esse que, mesmo assim, desastradamente apostou neles, numa falsa expectativa de
que a sua vontade soberana prevaleceria", escreve.
Xanana diz-se
"envergonhadíssimo pela culpa suprema" de ter criado o CNRT no
momento de crise de 2006-2007 "e pelos retrocessos sociais e económicos do
país, desde então, num estúpido esforço, sem valor nenhum, de remediar as
feridas, abertas por elites que souberam com dignidade pôr os interesses de
grupos acima dos interesses do País".
Considera Lu-Olo o
"intocável presidente" da Fretilin - que está agora na oposição -
ironiza sobre a sua "inegável estatura de chefe de Estado" e
congratula o Presidente "pelo formidável exemplo que está a dar aos
cidadãos timorenses, incluindo os partidos políticos".
Na carta Xanana Gusmão insiste
que o PR nomeia os membros do Governo sob proposta do primeiro-ministro, que a
constituição determina o princípio fundamental da presunção de inocência e que
a "condenação pela prática de crimes compete aos Tribunais e não aos
demais órgãos de soberania".
"A expressão - ?sob proposta
do Primeiro-Ministro' - significa que a competência do Presidente para a
nomeação dos membros do Governo está sempre subordinada ao critério político do
primeiro-ministro", escrever.
ASP // PJA
A memória importa, principalmente
aos povos. Até agora caiu no esquecimento a peripécia da expulsão de
magistrados portugueses e outros de nacionalidade estrangeira, assim como um
polícia português em serviço em Timor-Leste, devido a investigações
relacionadas com Xanana Gusmão que estavam fazendo. Depois foi o
"deserto" e nada aconteceu.
As areias do tempo encobriram a figura
histórica que é Xanana (junto com muitos outros timorenses). O assunto também
deu em nada, encoberto pelas tais areias sopradas por Xanana. A justiça
timorense não deu seguimento ao processo. Ou aos processos investigativos. Tudo
sem consequências. Corrupção, um tema e acontecimento antigo e constante em
Timor-Leste. Mas há quem esteja acima das leis, da Constituição. Em Timor-Leste
existe pelo menos um cidadão notável que está "acima de qualquer
suspeita", nem que seja criminoso. Para quem viu o filme exatamente com
esse título sabe a resposta.
O artigo, entre outros, que faz a
imagem agora exibida provém de Notícias ao Minuto com data de 08/11/2014. Foi
já há tempos, mas a memória não esquece o "caso". Um visado inocente,
impoluto, devia ter a honestidade de querer provar a inocência do que o acusavam
e não abafar o processo a partir da investigação. Mas... cada um é como cada
qual. Os povos sabem que assim é. E julgam, e condenam (às vezes sem razão). A
maior parte das vezes (com razão) calam-se... por medo.
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