quarta-feira, 11 de julho de 2018

Xanana Gusmão diz estar preocupado com "saúde mental e política" do PR timorense


Díli, 10 jul (Lusa) - O líder da coligação do Governo timorense, Xanana Gusmão, teceu hoje duras críticas à decisão do Presidente não dar posse a vários membros do Governo, mostrando-se preocupado com a "saúde mental, psicológica e política" do chefe de Estado.

"Permita-me, Excelência, que comece por o cumprimentar, desejando-lhe tudo de bom", escreve Xanana Gusmão numa carta entregue hoje a Francisco Guterres Lu-Olo, a que a Lusa teve acesso.

"Expresso-lhe este sentimento, porque estou extremamente preocupado com a sua saúde mental, psicológica e política, neste conturbado processo onde se impõe medirem-se as competências, à luz de uma Constituição que os Senhores é que escreveram, entendem com mestria e interpretam com uma sagacidade incomum, inacessível a vulgares cidadãos como eu", escreve Xanana Gusmão.

Xanana Gusmão assina a carta como presidente do CNRT e o documento foi enviado para o Presidente num momento de tensão entre Lu-Olo, o primeiro-ministro Taur Matan Ruak e a Aliança de Mudança para o Progresso (AMP), coligação que venceu as legislativas com maioria absoluta e que integra o CNRT, o PLP (de Matan Ruak) e o KHUNTO.

Xanana Gusmão insiste que "enquanto o Governo não se encontrar plenamente constituído, não é possível, de forma politicamente responsável, apresentar o Programa de Governo o que permitirá pôr fim ao sufoco financeiro que o país atravessa".

É preciso a nomeação dos membros do Governo para "preparar, de forma séria e consistente, uma proposta de Orçamento Geral do Estado para 2018 que retire o país do regime de duodécimos e que assegure, de forma sistemática, regular e transparente, o financiamento das despesas do Estado".

Se a situação se mantiver, diz, "será da exclusiva responsabilidade do Presidente da República, que insiste em manter a situação de impasse político criada por si próprio, por não respeitar a vontade soberana do povo timorense".

"A situação política no nosso país está em vias de um colapso e isto é grave, porque os recursos financeiros do Estado são agora muito limitados, pelo que todos os Responsáveis Políticos deveriam pautar as suas ações com prudência, honestidade e sensatez.", escreve.

"Neste momento o país, o nosso Povo, precisam que o Chefe de Estado demonstre estar à altura das altas responsabilidades constitucionais que lhe incumbem, contribuindo para a estabilidade política, para a governabilidade do Estado e para a paz social", argumenta.

A carta deixa várias referências a muitos dos temas que têm suscitado debate nos últimos anos em Timor-Leste, desde o tema da corrupção à relação entre o próprio Xanana Gusmão e a Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) e até à acusação, por parte da AMP, de que Lu-Olo atua mais como presidente da Fretilin do que do Estado.

Deixando várias declarações sobre a leitura que o CNRT faz das competências do Presidente da República, Xanana Gusmão tece acusações de posturas contraditórias de Lu-Olo face a assuntos que incluem nomeações de cargos públicos.

No documento, Xanana Gusmão ironiza com as referências que têm sido feitas ao seu partido e aos seus membros, mas deixando sempre críticas duras ao chefe de Estado, com múltiplas referências tanto ao passado da luta pela libertação de Timor-Leste da ocupação indonésia como a casos já depois da restauração da independência.

"Estou, de corpo e alma, arrasadíssimo porque tenho um partido corrupto, cheio de milícias e autonomistas, sem veteranos de gema e fulgor como é vossa excelência e seus camaradas, um partido político cujos quadros e demais membros não entendem nem falam o português e são presumivelmente detestados pela maioria do povo, povo esse que, mesmo assim, desastradamente apostou neles, numa falsa expectativa de que a sua vontade soberana prevaleceria", escreve.

Xanana diz-se "envergonhadíssimo pela culpa suprema" de ter criado o CNRT no momento de crise de 2006-2007 "e pelos retrocessos sociais e económicos do país, desde então, num estúpido esforço, sem valor nenhum, de remediar as feridas, abertas por elites que souberam com dignidade pôr os interesses de grupos acima dos interesses do País".

Considera Lu-Olo o "intocável presidente" da Fretilin - que está agora na oposição - ironiza sobre a sua "inegável estatura de chefe de Estado" e congratula o Presidente "pelo formidável exemplo que está a dar aos cidadãos timorenses, incluindo os partidos políticos".

Na carta Xanana Gusmão insiste que o PR nomeia os membros do Governo sob proposta do primeiro-ministro, que a constituição determina o princípio fundamental da presunção de inocência e que a "condenação pela prática de crimes compete aos Tribunais e não aos demais órgãos de soberania".

"A expressão - ?sob proposta do Primeiro-Ministro' - significa que a competência do Presidente para a nomeação dos membros do Governo está sempre subordinada ao critério político do primeiro-ministro", escrever.

ASP // PJA

Imagem: Recorte de Notícias ao Minuto com data de 08/11/2014, com base em publicação no Expresso. Retirado da página do Facebook de Timor Agora, acompanhado do seguinte texto:


A memória importa, principalmente aos povos. Até agora caiu no esquecimento a peripécia da expulsão de magistrados portugueses e outros de nacionalidade estrangeira, assim como um polícia português em serviço em Timor-Leste, devido a investigações relacionadas com Xanana Gusmão que estavam fazendo. Depois foi o "deserto" e nada aconteceu. 

As areias do tempo encobriram a figura histórica que é Xanana (junto com muitos outros timorenses). O assunto também deu em nada, encoberto pelas tais areias sopradas por Xanana. A justiça timorense não deu seguimento ao processo. Ou aos processos investigativos. Tudo sem consequências. Corrupção, um tema e acontecimento antigo e constante em Timor-Leste. Mas há quem esteja acima das leis, da Constituição. Em Timor-Leste existe pelo menos um cidadão notável que está "acima de qualquer suspeita", nem que seja criminoso. Para quem viu o filme exatamente com esse título sabe a resposta.

O artigo, entre outros, que faz a imagem agora exibida provém de Notícias ao Minuto com data de 08/11/2014. Foi já há tempos, mas a memória não esquece o "caso". Um visado inocente, impoluto, devia ter a honestidade de querer provar a inocência do que o acusavam e não abafar o processo a partir da investigação. Mas... cada um é como cada qual. Os povos sabem que assim é. E julgam, e condenam (às vezes sem razão). A maior parte das vezes (com razão) calam-se... por medo.

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