O líder do maior partido da
coligação do Governo em Timor-Leste, Xanana Gusmão, ameaçou hoje desencadear um
processo de destituição do Presidente da República se este mantiver a
"rejeição sistemática e não fundamentada" de membros do Governo propostos
pelo primeiro-ministro.
A ameaça faz parte de uma carta
cheia de duras críticas e acusações que o presidente do Congresso Nacional da
Reconstrução Timorense (CNRT) entregou hoje ao Presidente da República,
Francisco Guterres Lu-Olo e a que a Lusa teve acesso.
Gusmão considera que o chefe de
Estado está obrigado a "respeitar o princípio da separação dos
poderes" e que "o respeito pela autonomia do Governo enquanto órgão
constitucional soberano, exige a solidariedade institucional e o reconhecimento
pelo Presidente da República das competências próprias e exclusivas do
Primeiro-Ministro para escolher os membros do seu Governo".
Por isso, escreve, "a
rejeição sistemática e não fundamentada, pelo Presidente da República, dos
nomes dos titulares propostos pelo primeiro-ministro para integrar o
Governo" pode ser vista pelo CNRT como uma "tentativa de usurpação de
poderes e, neste sentido, configurar uma 'violação clara e grave das suas
obrigações constitucionais'".
Xanana Gusmão assina a carta como
presidente do CNRT e o documento, com o timbre do partido, foi enviado num
momento de tensão máxima entre Lu-Olo, o primeiro-ministro Taur Matan Ruak e a
Aliança de Mudança para o Progresso (AMP), coligação que venceu as legislativas
de maio com maioria absoluta - integra o CNRT, o PLP e KHUNTO.
Lu-Olo continua a recusar-se a
dar posse a um conjunto de membros do Governo propostos por Taur Matan Ruak, ou
por alegadamente terem "o seu nome identificado nas instâncias judiciais
competentes" ou por possuírem "um perfil ético controverso".
Essa postura, que não ficou
resolvida em várias reuniões entre ambos, levou ontem as bancadas da AMP no
Parlamento a negarem um pedido de autorização de Lu-Olo para uma visita de
Estado a Portugal - que a constituição exige - por o responsabilizarem pelo
impasse.
A AMP diz ainda que o Estado está
já sem dinheiro para o seu funcionamento normal, tendo nos cofres apenas 20 dos
80 milhões de que necessita para pagar salários, pensões e bens e serviços
essenciais, incluindo diesel para as centrais elétricas do país.
Por duas vezes Xanana Gusmão já
se recusou a tomar posse, faltando ainda cerca de uma dezena de elementos
poderem assumir formalmente as suas funções, sendo que a maioria dos que não
tomaram posse são do CNRT.
A carta refere a aplicação do
artigo 75 da constituição - sobre "responsabilidade criminal e obrigações
constitucionais" - onde se explica que o Presidente "responde perante
o Supremo Tribunal de Justiça pela violação clara e grave das suas obrigações
constitucionais".
A iniciativa "cabe ao
Parlamento Nacional, mediante proposta de um quinto e deliberação aprovada por
maioria de dois terços de todos os deputados" sendo que uma eventual
condenação "implica a destituição do cargo e a impossibilidade de
reeleição".
A ameaça é, pelo menos para já,
de difícil concretização já que a medida dificilmente teria o apoio de dois
terços dos 65 deputados, ou seja 43, número que as bancadas que apoiam o
executivo não alcançam.
Mesmo que se unissem todas as
bancadas do parlamento contra a Fretilin - partido do Presidente da República e
que controla 23 lugares no parlamento - ficariam aquém desse número, somando
apenas 42 cadeiras.
Lusa | em SAPO TL
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