segunda-feira, 16 de maio de 2016

"Pendurar e proibir", a cerimónia tradicional para travar o lixo nas praias de Timor-Leste


António Sampaio, da Agência Lusa

Díli, 15 mai (Lusa) - O tronco, enterrado na areia, em cujos ramos secos estão pendurados sacos e garrafas de plástico e um coral marca a proibição que vigora desde hoje nas praias de Díli e que é punida com uma multa de um porco crescido.

"Entre a estátua do Cristo Rei e a estátua de João Paulo II está proibido arrancar corais e deitar lixo nas praias. Quem o fizer terá que pagar uma multa de um porco crescido", explica Pio Ataíde, lia nain (chefe tradicional) na capital timorense.

A cerimónia Tara Bandu (Pendurar e Proibir) foi conduzida pelos chefes tradicionais no lançamento da campanha "Praia Limpa, Ambiente Saudável" e perante representantes da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), em Díli para um encontro de ministros do Mar.

O tronco, de que nascerá uma nova árvore, "ficará aqui entre a terra e o mar", na Praia dos Coqueiros, na Avenida de Portugal, em frente à sede da CPLP, para relembrar a proibição.

Foi abençoado pelo sangue de uma galinha e de um leitão, mortos na praia, regado com cerveja e acolhido pelos cantos tradicionais dos lia nain que convocaram os antepassados para "abençoar a praia".

Na mesma praia, com o mesmo propósito, reuniram-se os chefes tradicionais, com as cerimónias animistas antigas em que relembraram que "a natureza é sagrada", e um grupo de jovens, que há um ano criou o Movimento Tasi Mos (Mar Limpo).

A campanha que hoje arranca é governamental - foi aprovada uma resolução nesse sentido esta semana - envolve várias agências e entidades do executivo mas pode dizer-se que, em grande parte, foi estimulada pela vontade do primeiro grupo de 10 ou 15 pessoas, a génese do Tasi Mos, que se reuniu para limpar uma praia.

"É um movimento social, formado por jovens timorenses com preocupação crescente no âmbito ambiental. Somos frequentadores de praia e temos uma preocupação comum: poder disfrutar das praias de Timor", explicou Gally Soares Araújo, o responsável do projeto, à Lusa.

"As praias têm vindo a deteriorar-se e, por isso, pelo facebook começámos a lançar desafios a convidar as pessoas a vir connosco limpar a praia. Isso tem vindo sempre a crescer e agora o Governo já começou a notar a nossa campanha", afirmou.

São eles a ponta de lança da campanha que, como explicou Estanislau da Silva, ministro de Estado e Coordenador dos Assuntos Económicos e ministro da Agricultura e Pescas, que quer "sensibilizar os cidadãos e o Governo para a importância da limpeza das praias para o desenvolvimento sustentável de Timor".

"Com as praias poluídas não atrairemos turismo, não seremos capazes, nós próprios de desenvolver atividades de lazer nas mesmas. Mataremos os nossos peixes e estaremos a comprometer a saúde das nossas crianças", afirmou.

O lixo marinho foi o tema de um debate promovido antes do lançamento da campanha e onde participaram especialistas de vários países para avaliar recomendações sobre o que fazer nesta temática em Timor-Leste.

O diretor geral do Ambiente, João Carlos Soares, destacou a necessidade de encontrar soluções holísticas e referiu-se aos esforços do Governo para criar medidas tanto a montante como a jusante, para a recolha e tratamento de lixo e para a limpeza a ambiental.

Um problema complexo, disse, como se evidencia em Díli onde a melhoria dos sistemas de drenagem teve o efeito de levar mais lixo para as ribeiras e para o mar.

Danina Coelho, infeciologista do Gabinete de Garantia de Qualidade Na Saúde no Ministério Da Saúde recordou que mais do que os resíduos sólidos visíveis, como o plástico e outros detritos, um dos maiores problemas são a acumulação de microrganismos patogénicos na areia da praia e no mar.

Poluentes que causam problemas gastrointestinais e cutâneos, criando condições para vetores de doenças, como moscas, baratas e ratos.

ASP // MSF

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