quinta-feira, 20 de setembro de 2018

CNRT vai pedir investigação do parlamento timorense a projeto de Oecusse -- Xanana Gusmão


Díli, 20 set (Lusa) - Xanana Gusmão, líder do maior partido do Governo timorense, o CNRT, informou o Presidente da República que vai propor uma comissão para investigar as responsabilidades "financeiras e disciplinares" por infrações detetadas no projeto do enclave de Oecusse.

"A bancada do CNRT irá tomar a iniciativa de propor que seja constituída uma comissão de inquérito do Parlamento Nacional a fim de que se assegure a execução das responsabilidades financeiras e disciplinares por infrações detetadas pela Câmara de Contas, neste volumoso dossier", escreve Xanana Gusmão numa carta enviada ao chefe de Estado obtida hoje pela Lusa.

Na carta, datada de 10 de setembro e que tem como assunto "a importância do Estado versus a importância de indivíduos", Xanana Gusmão refere-se a uma polémica auditoria da Câmara de Contas timorense ao projeto da Região Administrativa Especial de Oecusse-Ambeno (RAEOA) referente ao ano de 2014.

O conteúdo do parecer, onde são detetadas várias alegadas regularidades, não foi até agora revelado oficialmente pelo Tribunal de Recurso, mas partes do texto têm sido divulgadas nas últimas semanas nas redes sociais timorenses.

O projeto, criado durante o V Governo, em que Xanana Gusmão era primeiro-ministro, é liderado por Mari Alkatiri, primeiro-ministro do VII Governo e secretário-geral da Fretilin, atualmente a maior força política da oposição, da qual o Presidente da República, Francisco Guterres Lu-Olo, ainda é presidente.

Na carta de três páginas Xanana Gusmão diz ainda que a bancada do Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT) - maior força política da Aliança de Mudança para o Progresso (AMP), a coligação do Governo - vai propor também pedir à Câmara de Contas que conclua "com urgência" uma auditoria à RAEOA referente aos anos entre 2016 e 2018.

"E finalmente, para que as conclusões sejam justas e aceites por todos como não politizadas, a bancada do CNRT vai propor ainda ao Parlamento Nacional uma auditoria à RAEOA/ZEESM desde o ano 2014 a este ano, 2018", refere ainda.

"Pelo facto de vivermos numa sociedade onde o controlo social tem sido fundamental para a avaliação imparcial do desempenho dos governantes, irei seguidamente enviar também copias deste dossiê para as organizações da sociedade civil, incluindo a imprensa escrita", refere.

Na carta, marcada pela ironia, Xanana Gusmão diz estar a responder ao "challenge" que representou a "imponente mensagem" de 20 de agosto do chefe de Estado, em que Francisco Guterres Lu-Olo se refere à situação política.

Um discurso, escreve Xanana Gusmão, em que o Presidente "recomendou ao povo refletir e considerar, e consequente, retirar as devidas lições, sobre o que era mais importante: os 9 (onde se incluem 7 quadros do CNRT) não empossados, ou a nação".

O líder do CNRT explica que decidiu enviar a documentação referente à auditoria "para aliviar o difícil trabalho de vossa excelência nesta nobre missão de velar pelos interesses da nação".

"Estou plenamente confiante de que os exímios assessores jurídicos e financeiros que rodeiam vossa excelência estarão altamente dotados da genialidade da sua expertise para detetarem mais apropriadamente as possíveis gravíssimas falhas da Câmara de Contas e assim impedir que vossa excelência, senhor Presidente, tenha que tomar decisões extemporâneas ou totalmente fora do necessário contexto político, por passíveis conclusões apressadas sobre possíveis conflitos de interesses", afirmou.

Nos bastidores da polémica está uma situação que se arrasta desde junho e que diz respeito a nove membros do Governo indigitados pelo primeiro-ministro Taur Matan Ruak, aos quais o Presidente da República, Francisco Guterres Lu-Olo, não deu posse, alguns por terem "o seu nome identificado nas instâncias judiciais competentes" e outros por possuírem "um perfil ético controverso".

O Governo apresentou nomes alternativos a três deles e o Presidente acabou por assinar, nesses casos, decretos de nomeação que acabaram por não ter efeitos práticos, já que os ministros nomeados não tomaram posse, em solidariedade com os restantes colegas.

Um deles foi Xanana Gusmão que foi nomeado por duas vezes para cargos diferentes no Governo da coligação da Aliança de Mudança para o Progresso (AMP) e que acabou por nunca tomar posse, afastando-se depois do grupo de ministeriáveis.

ASP // JPS

Mari Alkatiri diz que já tinha pedido auditoria a projeto de enclave timorense de Oecusse


Pante Macassar, Timor-Leste, 20 set (Lusa) - O presidente da Região Administrativa Especial de Oecusse-Ambeno (RAEOA), Mari Alkatiri, disse hoje que está, com a sua equipa, a trabalhar nas recomendações de um relatório de auditoria da Câmara de Contas timorense sobre o projeto do enclave timorense.

Em declarações à Lusa, Alkatiri desdramatizou igualmente a decisão do Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT), maior partido da coligação do Governo, de solicitar uma auditoria adicional à RAEOA, afirmando que ele próprio já a tinha pedido.

"A auditoria que se está a pedir já foi pedida por mim quando fui primeiro-ministro. Eu próprio pedi a auditoria porque também quero saber exatamente como as coisas têm andado", disse Alkatiri, que chefiou o VII Governo, minoritário, entre 2017 e as eleições antecipadas deste ano.

Alkatiri reagia assim ao conteúdo de uma carta de Xanana Gusmão, presidente do CNRT, ao Presidente da República, em que diz que o seu partido vai propor uma comissão parlamentar para investigar as responsabilidades "financeiras e disciplinares" por infrações detetadas no projeto do enclave de Oecusse.

"A bancada do CNRT (...) irá tomar a iniciativa de propor que seja constituída uma comissão de inquérito do Parlamento Nacional a fim de que se assegure a execução das responsabilidades financeiras e disciplinares por infrações detetadas pela Câmara de Contas, neste volumoso dossier", escreve Xanana Gusmão na carta enviada a 10 de setembro ao chefe de Estado, Francisco Guterres Lu-Olo, e obtida hoje pela Lusa.

O conteúdo do parecer, em que são detetadas várias alegadas irregularidades, não foi até agora revelado oficialmente pelo Tribunal de Recurso, mas partes do texto têm sido divulgadas nas últimas semanas nas redes sociais timorenses.

Na carta, Xanana Gusmão diz que vai distribuir cópias do relatório à imprensa. Excertos do documento têm sido divulgados por páginas do CNRT e de alguns militantes do partido no Facebook.
Questionado sobre o relatório, Mari Alkatiri remeteu declarações para mais tarde.

"Não quero comentar publicamente sobre o relatório porque ainda estamos a responder às recomendações. O relatório dá um prazo de seis meses, que vai até fevereiro de 2019, para trabalhar sobre as recomendações", explicou.

Alkatiri lamentou ainda o que diz ser o "objetivo político" de divulgar elementos parciais do relatório nas redes sociais, recordando que este "não é o primeiro relatório da Câmara de Contas sobre instituições do Estado, mas o único que tem sido politizado por uma certa corrente".

No rescaldo das eleições antecipadas de maio - ganhas com maioria absoluta pela coligação AMP (que integra o CNRT) - os líderes Xanana Gusmão e Taur Matan Ruak (atual primeiro-ministro) tinham afirmado que esperavam que Mari Alkatiri, líder da Fretilin, se demitisse do cargo na RAEOA.

Os líderes da AMP chegaram mesmo a prometer afastar Alkatiri na primeira reunião do Conselho de Ministros.

Questionado sobre esse aspeto, Alkatiri disse que está no cargo porque foi empossado para tal pelos órgãos correspondentes que "podem agora tomar decisões contrárias".

"Isso em nada me ofende. Se me tivesse resignado ou demitido seria mais difícil tornar as coisas mais claras [no que toca à auditoria]. Mas acho que tem havido mais ponderação por parte do órgão de tutela e do senhor Xanana Gusmão, para não me tirar daqui", disse.

"Mas isso pode ocorrer a todo o momento, claro. O meu mandato termina a 30 de julho e até lá vou fazer o melhor possível para colaborar", afirmou.

Sobre a situação política atual do país, Alkatiri - que não falava alargadamente aos jornalistas desde junho - disse que decidiu afastar-se "intencional e conscientemente".
"Há aqui um jogo entre órgãos de soberania e eu estou fora de todos os órgãos de soberania e não quis estar implicado nas contradições entre os órgãos de soberania", disse.

"Estando fora, embora servindo o Estado, achei que devia abster-me de me pronunciar sobre isto e continuo com esta postura", sublinhou.

ASP // VM