terça-feira, 8 de setembro de 2015

Professores com muitas dúvidas sobre Educação Cívica em Macau


Macau, China, 08 Set (Lusa) -- A um ano do início da Educação Cívica obrigatória no ensino primário em Macau, depois de este ano ter começado na pré-primária, são muitas as dúvidas dos professores sobre uma disciplina que foi repudiada em Hong Kong.

Em que consiste 'amar a pátria'? Como é que tal sentimento é avaliado? Os alunos podem criticar o comportamento da China? Com que impacto para as suas notas? E os que não são chineses? Estas são algumas das questões levantadas por professores ouvidos pela agência Lusa.

Os Serviços de Educação e Juventude (DSEJ) falam de objetivos educativos que passam pelo "reforço da consciência nacional e universalista dos alunos (...), da sua consciência cívica, com vista ao exercício de uma cidadania responsável".

De acordo com o material a que já teve acesso, a professora primária Maggie Vai estima que entre 20 a 30% da disciplina incida sobre os chamados conteúdos patrióticos -- incluindo a promoção do 'amor à pátria' -- aqueles que levaram a uma rejeição da matéria no território vizinho.

"Não me parece muito relevante perguntar aos alunos se amam o seu país. Ensinar a história ou falar de figuras importantes, isso claro que sim. Devem conhecer [o país] mas isso tem de significar que o devem amar sem discutir?", questiona.

Maggie Vai receia que exista um entendimento, não explícito, de que "Educação Cívica é amar Macau, o que equivale a amar a China, o que quer dizer amar o Partido Comunista".

O livro recomendado -- que não é obrigatório -- usa uma linguagem que enfatiza a "valorização" da China e afasta a crítica, diz. "Se a amam [a China], ótimo, mas se não amam deviam poder dizer porquê. Não vi [no material curricular] nada sobre a crítica, tudo tem de ser positivo", comenta.

A avaliação é uma grande preocupação para a professora: "Como é que posso saber se amam o seu país? E o que significa chumbar um aluno a Educação Cívica? Que ele não tem moral?".

Sobre a avaliação, a DSEJ garante que será abrangente, incluindo "observação do desempenho dos alunos nas aulas, registo das atividades", interação com o professor, "autoavaliação dos alunos, avaliação entre colegas, intercâmbios com encarregados de educação e o pessoal envolvido", além "dos exames tradicionais escritos".

O mesmo tipo de preocupações tem o professor do ensino secundário Jack Ng, que ainda vai esperar dois anos letivos para o ensino da disciplina. "A Matemática é algo fixo, a Educação Cívica é um pouco mais política, tem que ver com quem define a verdade e o que deve ser feito em sociedade. Acho que os professores não estão preparados para debater isto. Há um discurso que defende que devemos apresentar apenas uma resposta correta", alerta.

"O que significa amar um país? Podemos ser nós a definir esse amor ou temos de estar todos a falar do mesmo?", questiona, lembrando que, apesar do manual recomendado pela DSEJ, uma publicação da China continental, não ser obrigatório, poucas escolas devem optar por criar o seu material, devido à já elevada carga de trabalho.

Maggie Vai lembra ainda outro problema: e os alunos que não são chineses? Além da Escola Portuguesa de Macau, a cidade conta com alguns estabelecimentos de ensino internacionais e, ainda que minoritária, uma população estudantil estrangeira.

"Os alunos têm de reconhecer a sua nacionalidade como chinesa e conhecer a história da China. Mas e se não forem chineses? Temos tantos alunos internacionais", critica.

Sobre a disciplina, a Escola Portuguesa de Macau explica que ainda não recebeu "diretivas específicas".

"Não sabemos bem o que a DSEJ pretende e não vale a pena falarmos do que não sabemos. Somos uma escola portuguesa e tem sempre de haver adaptações. Não estamos preocupados ainda", diz à Lusa Zélia Mieiro, a vice-presidente da direção da escola.

ISG // VM

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