quinta-feira, 4 de junho de 2015

China tem sido bem-sucedida em eliminar memória de Tiananmen -- Investigadora


Hong Kong, China, 03 jun (Lusa) -- A investigadora Louisa Lim, que escreveu um livro sobre o movimento pró-democracia de Tiananmen, considera que "a China tem sido notavelmente bem-sucedida em eliminar a memória" da repressão de há 26 anos, mantendo-a em curso.

Louisa Lim disse ter ficado "chocada com o nível de ignorância sobre as mortes dos estudantes chineses em 1989" enquanto se dedicava à investigação que resultou no livro "The People's Republic of Amnesia: Tiananmen Revisited", publicado no ano passado.

"Quando eu mostrava a fotografia icónica do homem à frente do tanque em Pequim, 85% dos estudantes não faziam ideia do que mostrava a imagem ou de onde tinha sido tirada", recordou à agência Lusa.

Para Louisa Lim, "apesar do advento da Internet, a China tem sido notavelmente bem-sucedida em eliminar a memória do movimento de Tiananmen e a sua repressão mortífera" e "o facto de estes acontecimentos (...) estarem amplamente esquecidos mostra o quão bem-sucedido o Governo tem sido em intimidar a geração que os viveu e testemunhou".

"Pequim tem conseguido tornar o preço da memória tão elevado que poucos estão dispostos a pagá-lo", frisou.

A madrugada de 04 de junho de 1989, quando o Governo decidiu pôr fim a quase dois meses de protestos pró-democracia na capital e em outros pontos do país mobilizando o exército, que saiu para a rua com tanques e disparou contra civis desarmados, continua a ser um tema tabu. "Em termos de discussão pública, é evidente que não há movimentos nesse sentido", frisou.

"Pelo que temos visto até agora da era (do Presidente chinês) Xi Jinping, não há sinais de qualquer avanço para uma reavaliação do movimento de Tiananmen. Pelo contrário, tem havido uma tendência clara para punir quaisquer atos de homenagem àqueles que morreram, até mesmo eventos de pequena escala, realizados à porta fechada", adiantou.

A académica ligada à Universidade de Michigan sustentou que "grupos de direitos humanos no exterior estimaram que mais de 150 pessoas foram detidas ou colocadas em prisão domiciliária no período de preparação para o aniversário do ano passado".

"É notável que a repressão não terminou com o aniversário, mas está em curso, nomeadamente com a detenção do ativista Chen Yunfei, que enfrenta acusações de incitação à subversão contra o poder do Estado e de instigar problemas após ter visitado, em março último, o túmulo de um estudante morto em 1989," afirmou.

Louisa Lim referiu ainda a publicação de uma carta aberta de 11 estudantes chineses no estrangeiro, que motivou na semana passada uma resposta contundente do Global Times, num editorial onde se lê que "a sociedade chinesa chegou a um consenso para não debater o incidente de 1989".

"O Global Times denunciou que os estudantes tinham sido alvo de 'lavagem cerebral por forças estrangeiras hostis'. (...) Mas talvez este artigo tenha sido ele próprio muito temido, uma vez que a versão chinesa foi apagada do 'site' pouco tempo depois, demostrando que ainda não há espaço para a discussão pública", referiu.

O livro de Louise Lim, que revisita Tiananmen, aborda também a contestação na cidade de Chengdu, outro "choque" com que a investigadora se deparou: "Fui à procura de testemunhas, que me deram diários, fotografias e relatos de atos extraordinários de brutalidade. O próprio Governo admitiu que oito pessoas morreram em Chengdu, incluindo dois estudantes, mas a imprensa estrangeira nunca conseguiu acompanhar esta questão".

"Foi dececionante aperceber-me o quão facilmente os acontecimentos que estão de fora da visão da imprensa ocidental podem ser esquecidos", concluiu.

FV (ISG) // JMR

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